16 de outubro de 2012

Livre (?) Arbítrio - Parte 2


... Não me lembro de ter sonhado. Apenas dormia. Um sono pesado e escuro. Somente dormindo.
Também não sei quanto tempo se passou, mas tive a quase certeza de que foi uma grande quantidade. Mas poderia estar errado. Já havia perdido por completo a noção de tempo, o dia poderia ser noite, ou vice versa, uma segunda poderia ser uma sexta, e assim consecutivamente.
Isso não importava. Só me importava o meu desejo de acabar com toda essa aflição de não sentir nada abaixo do pescoço, e finalizar, de uma vez por todas, a minha dor de cabeça que me deixava inconsciente por tempo indeterminado.
Ao abrir os olhos novamente, me deparo com um ambiente completamente diferente: uma máquina de RM ou Tomografia estava sobre minha cabeça. Como eu vim parar aqui? Mais uma de minhas perguntas sem resposta...
-Não se mexa, o senhor está em uma máquina de Ressonância Magnética. O doutor Celso requisitou esse exame, por causa de sua dor de cabeça que causou o desmaio e a parada cardíaca _ Foi tudo o que eu prestei atenção da voz entediada que vinha do lado de fora do aparelho.
Eu havia tido uma parada cardíaca! Sequer cheguei aos 40 anos, e sofri um acidente que paralisou noventa por cento do meu corpo, e ainda tive uma parada cardíaca. Isso é vida?

Alguns minutos mais tarde, estava de volta ao meu quarto. O enfermeiro me trouxe para a CTI na maca direto da sala de RM, e encontrei Geovana sentada no sofá lendo uma das revistas que havia pegado na sala de espera. Posso jurar até que já tinha visto essa mesma revista na mão dela anteriormente. Quanto tempo será que já estou no hospital? Minha memória se torna cada vez mais embaralhada em relação a fatos de curto e longo prazo.
Meia hora depois, doutor Celso entra no quarto com uma expressão séria e chama Geovana para conversar. Da conversa nada pude ouvir, entretanto as reações de minha esposa já denunciavam o que estaria por vir, e não era nenhuma notícia boa.
Secadas suas lágrimas, ela assinou um formulário e se sentou na cama comigo. Suas caricias no meu rosto ao mesmo tempo me acalmaram e me deixaram assustado.
-O qu...e foi am...or?_Com muita dificuldade e a boca seca consegui proferir essas palavras.
-Nós sempre fomos sinceros um com o outro, e não será agora que passarei a mentir para você. O médico me informou que foi encontrado um coágulo que se formou no seu cérebro, devido ao acidente, e por causa dele você não consegue mexer seu corpo, têm essas fortes dores de cabeça quando submetido à stress e a perda de consciência.
Geovana me deu o veredito médico, mas eu sabia que havia mais, algo que ela estava escondendo. Suas lágrimas escorrendo pelo rosto ao olhar para mim falavam tudo que sua boca se recusava a proferir.
-E que mais?
-Eles terão de operá-lo hoje, e... A cirurgia é muito.... Arriscada. E você..... Pode não....... Voltar vivo dela e se........... Se voltar, poderá fic................... Ficar assim PRA SEMPRE_ Esse foi o limite em que ela pode suportar até cair em prantos sobre mim.

Nunca fui muito religioso, mas como todas minhas esperanças haviam se esgotado, resolvi recorrer a Deus, se é que existia um.
Com Geovana adormecida na cama ao meu lado, depois de ter demorado a se acalmar, fiquei reflexivo. Se Deus existe, por que estaria fazendo isso comigo? Seria uma prova de fé? Castigo por meus pecados? Não sei... Por via das dúvidas resolvi fazer uma reza, para que eu terminasse logo esse sofrimento e poupasse minha esposa de ter que passar por tudo isso comigo. Ela não merece isso.
Como já relatado, Geovana sempre foi muito atenciosa, e com um pequeno murmurinho, ela acordou e ouviu o que estava falando.
-Você não pode desistir, nem tudo está perdido. E não importa o que aconteça, eu te amo pelo que você é, pois o que me cativou foi o seu jeito e sua personalidade. O físico é só... Físico.
Essas palavras dela me fizeram repensar, entretanto a dor era maior do que a vontade de superar e viver. A dor de cabeça voltou a explodir em minha cabeça, e tudo o que sei é que fui levado às pressas para o centro cirúrgico adiantando a cirurgia já marcada. Minha vida estava por um fio, e estava cada vez mais próximo de meu objetivo final: a morte. Bastava que os médicos errassem, que Geovana me ajudasse ou que eu piorasse de vez, para acabar com tudo.

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