22 de dezembro de 2012

FIM

Apenas um aviso para quem, se é que alguém chegará a ler isso, ler: Este é um relato do ocorrido no dia do "fim do mundo" baseado em experiência própria e nos boatos e poucas informações causada por diversos fatores.

Eu nunca acreditei. Besteira. Pra quê perder meu tempo com esse tipo de baboseira? Apenas idiotices como já tinha ocorrido em 2000 na virada do século e um monte de bocós tinham acreditado e até se matado.
Era exatamente dessa forma que eu pensava até o dia 21 de dezembro de 2012 chegar de fato e tudo acontecer. E como todos (ou pelo menos a maior parte) também achavam até o fim de fato chegar.
Como último ato em vida sendo praticamente um andarilho, sozinho e sem família viva nesse mundo, resolvi escrever esse relato do que aconteceu no dia de hoje, que acabou por dizimar, acredito, a maior parte da população mundial, sem contar todos os ecossistemas, animais e plantas mortas. As informações são realmente escassas, e os problemas surgiram (e continuam aumentando) consecutivamente em velocidade exponencial que sequer tivemos tempo de nos preparar. De qualquer forma, decidi parar antes de me encontrar com minha inevitável morte para deixar escrito, para, quem sabe, alguém futuramente sair vivo e tentar entender tudo.
Sem contar que, vivendo em São Paulo, sei que os recursos já por vezes eram poucos pra algumas pessoas nas "condições normais" de sobrevivência. Com um apocalipse, as ruas eram tidas como zonas de uma guerra que não precisava ser declarada, e um pequeno nerd, magrelo e sem muita força não teria muitas chances lutando por comida.
Por mais cético que eu fosse quanto a isso, eu devo admitir: sempre achei os maias uma raça MUITO inteligente, e algumas coincidências do calendário feito por eles com fatos ocorridos nos nossos são um pouco... Assustadores. Como a previsão do eclipse no dia 11/8/1999. Mas nunca pensava que, só pelo fato do calendário DELES ter terminado, e denominarem como uma "Nova Era", que o mundo iria acabar.
Nunca pensava, no passado.

Bizarramente, os fatos que levaram ao fim do mundo começaram no dia 21 mesmo, "planejado" até com o fuso horário. Enquanto por aqui ainda era por volta de 16h da tarde do dia 20, no Japão já era dia 21, por volta de 3h da madrugada.
E o que todos os engenheiros espaciais (principalmente a NASA) não previram e desmentiram, aconteceu: uma explosão solar.
Antes de qualquer coisa, não, não foi uma explosão tipo "Olha o sol tá explodindo vamos todos pegar fogo e queimar como formiguinhas embaixo de uma lupa". Não. Mas dentre as explosões que normalmente aconteciam, era sabido que esse ano seria o pico dos maiores níveis de atividade solar, que ocorre a cada 11 anos. Até aí tudo bem. Contudo, uma grande explosão a dimensões jamais vistas ocorreu, e desligou praticamente todos os satélites e sistemas de telecomunicações. Com isso, já era quase impossível se comunicar ou ter notícias sobre o que estava acontecendo, sem telefones, celulares, redes sociais, televisões ou rádios. Tudo completamente desligado e chiado.
Com isso, os boatos já começaram a ganhar força, porém o pânico ainda não tinha sido instaurado.

Não até Estados Unidos praticamente sumir do mapa. A segunda maior potência econômica mundial simplesmente se tornou uma bola negra de fumaça, destruição e lava. MUITA lava.
Mesmo não morando lá e conseguindo poucas notícias, tenho certeza que culparam alguém no Oriente Médio por isso julgando como um ataque. Contudo, não houve tempo para retaliações. Por muito, há algum sobrevivente.
O fato é: Exatamente às 2h em horário local, com um pouco de comida estocada comprada por precaução durante a tarde do dia anterior, passei a noite em claro tentando ouvir qualquer coisa no rádio ou na tv, zapeando em busca de informações. Nisso, consegui um relance da TV Globo, que transmitia o Plantão continuamente aparentemente, dando a informação na voz de William Bonner que o supervulcão de Yellowstone havia entrado em erupção. Sabia o que isso significava, e todos que conseguiram assistir também.
Entretanto, a iminência do fim só veio mais tarde.
Por não pregar os olhos, acabei dormindo sentado na mesa da cozinha ao lado do rádio. Acabei sendo acordado por um grito vindo dele no meio da tarde, não sei se era uma locutora ou alguém na estação, mas era um grito feminino de desespero, misturado com um choro angustiado. Nos poucos segundos sem chiado, ouvi as exatas palavras: "Nibiru não era falso. Temos 3 horas..." e novamente o já costumeiro chiado.

Tive a audácia de olhar pra rua, e a cena que vi não foi confortante: Pessoas correndo desesperadas em busca de abrigo, vizinhos e melhores amigos apontando armas para ver quem ficava com um veículo funcionando e corpos. Havia CENTENAS de corpos nas ruas. Meus olhos me permitiam ver uma realidade pior que o Holocausto, do outro lado da rua. Cheguei a trancar a porta, mesmo sabendo que provavelmente seria inútil.
Refleti por exatos 43 minutos minha fútil vida. Minhas poucas conquistas e como tudo que eu fiz desencadearam, direta ou indiretamente, nessa solidão em que me situava até então. Até nos últimos minutos passarei desacompanhado.
Mesmo com toda essa depressão, cheguei à conclusão que ainda havia algo de útil que eu poderia fazer: escrever o pouco que eu sabia.
E eis que cá estou. Neste exato momento que escrevo estas palavras, são 18h:51min do dia 21 de dezembro de 2012. Estou incomunicável com o mundo e não sei tudo o que se passa de minha porta trancada e barrada com o sofá pra fora. Sei que seria idiotice tentar evitar. Quem sabe se fosse mais forte ou tivesse uma arma... De qualquer forma, a reflexão já se foi, não voltarei a pensar nisso novamente. E finalizo crendo e esperançoso de que nem toda a raça humana tenha sido extinta, e alguém consiga ler esse relato, que ficará aberto e salvo na Área de Trabalho com o nome "FIM", após eu colocar o notebook no modo suspenso, com a etiqueta "LIGUE" sobre ele, junto com a versão impressa.

E caso haja alguém lendo tudo isso, peço desculpas por não ter detalhes, mas se você está vivo, seja na minha geração ou uma distante que, de alguma forma, sobreviveu e se multiplicou, consegue imaginar o quão difícil foi esse momento, e posso dizer: Parabéns, você é um vencedor. Você está vivo. Apenas faça sua vida valer a pena. Você não sabe o que pode acontecer no dia seguinte, mesmo que tenha ouvido previsões.