16 de outubro de 2012

Livre (?) Arbítrio - Parte 1

Acordo e tento abrir os olhos, mas uma forte dor de cabeça me atinge, se prolongando por todo meu corpo. Sinto-me fraco, como se não conseguisse levantar um dedo sequer. Tento fazê-lo, mas não sinto minha mão. Não sinto meu quadril, pernas e pés também. Uma pontada de desespero perpassa meu corpo, e, apesar da dor, resisto e tento abrir os olhos, com sucesso. Ao fazê-lo, uma forte luz me cega por alguns segundos, e após acostumar minha visão àquela luz, me dou conta de onde estou.
Barulhos de monitores cardíacos estouram em meus ouvidos como se fosse um show de rock, a ponto de não conseguir não dar atenção a eles. Noto-os, com fios ligados ao meu peito, e outros fios pelo meu rosto e braço.
Estou em um leito de hospital.

Como vim parar aqui? Por que estou aqui? Quando isso aconteceu? Não consigo me lembrar de nada... O desespero volta a tomar conta de mim, até que minha esposa aparece em meu restrito campo de visão. Ela me olha com profunda tristeza, quase como se estivesse morto... Estaria eu morto? Não... O monitor cardíaco não parou, e eu não fui para meu julgamento. Mas então por que não consigo falar, ou me mexer ou dar sinal de que estou vivo?
Uma pontada de dor de cabeça volta a me atingir, dessa vez, nas têmporas, e me faz desmaiar de dor.

Acordo novamente, sem saber quanto tempo depois. Alguns minutos, algumas horas talvez. Talvez alguns dias até. Dessa vez, não tento abrir os olhos imediatamente. Mas tento novamente mexer qualquer músculo de meu corpo. Nada. Apenas meu pescoço se mexe com certa dificuldade. De olhos fechados, tento me recordar como vim parar e aqui, como tudo ocorreu. Alguns flashes iluminam minha memória, mas nada além disso. Lembro-me de meus amigos, uma pizzaria, eu no carro voltando para casa e um... Caminhão? Não sei ao certo, mas lembro-me de um veículo grande vindo em minha direção...
Não é preciso ser um gênio para saber juntar 2 com 2 e saber que dará 4. Então era isso, eu sofri um acidente de carro...
Tento mexer minhas pálpebras com muita calma, e noto que a luz já não está mais acessa. Com sofreguidão, abro por completo meus olhos, e consigo ver uma parte do teto, iluminado pelas luzes dos monitores. Movo meu pescoço para a direita, e vejo enrolada em um cobertor minha esposa, cochilando. Era noite. Ou teria ela virado a noite preocupada comigo? Geovana sempre foi muito cuidadosa... Tento chamá-la, mas sinto minha garganta "cheia", e uma tosse seca misturada com um gemido de dor causada por outra pontada na cabeça sai de meus lábios.
Aparentemente, foi o bastante para acordá-la.
-QUERIDO! Não tente falar. Fizeram uma traqueostomia para te ajudar a respirar _ disse ela em um tom de sussurro, mas preocupada.
Com lágrimas nos olhos, continuou:
-Que bom que você acordou, os médicos disseram que você poderia não acordar nunca mais... Eu não acreditei, nem por minuto. Eu vou chamar o doutor para vê-lo!
E antes que eu pudesse fazer algo, ela já havia saído do quarto procurando pela enfermeira mais próxima, porém, não rápido o suficiente para me rever da mesma forma como quando saiu: acordado. Uma forte enxaqueca me dominou e a vertigem me fez desmaiar novamente.

- ...ão estou mentindo doutor Celso, ele abriu os olhos e tentou falar comigo! Eu não estava sonhando!!!
-Senhora Geovana, você está cansada e está há muito tempo aqui no CTI. Você deveria ir para casa descansar, pois já lhe dissemos: apesar de todas as cirurgias e da melhora na função respiratória, as chances de seu marido recobrar a consciência são quase nulas. Afirmo também que talvez não tenha chances nem de haver atividade cerebral. Amanhã pela manhã requisitarei um eletroencefalograma para confirmar a morte cerebral_ Foi a resposta de meu médico, que até então não conhecia.
Sou um vegetal, um nada. Um quase morto para os médicos...
Após a saída do médico do quarto, reabro minhas pálpebras e vejo Geovana sentada no sofá-cama com os cotovelos apoiados no colo e cabeça em suas mãos, chorando. Noto que estou sem o aparelho de traqueostomia, e tento chamá-la. Um leve ruído sai das minhas cordas vocais. Imediatamente, ela levanta seu rosto em minha direção e abre um sorriso, o mesmo que me encantou quando a conheci.
-Amor, eu sabia que não estava ficando doida. Irei chamar o médi...
-N-Não...
Esse mínimo esforço me fez tossir, entretanto resisti à dor e continuei a falar.
-Mor...rer. Eu mor...
-Não querido, você não vai morrer. Eu não deixarei você morrer!
-Que...ro.
Ao ouvir essas palavras, uma expressão de espanto tomou conta de seu rosto, mas era a mais pura verdade. Os médicos me davam como morto, e, até onde pude notar, era um vegetal, inútil. Minha vida estava acabada mesmo sem um fim definitivo. Não tinha mais vontade de estar vivo, e a distância de passar dessa para uma melhor, mesmo com a incerteza de que será melhor, me agonia.
Geovanna se levanta do sofá e volta a procurar o médico. Desta vez, o mesmo consegue me ver acordado e de olhos abertos.
-Isso é... um milagre! O senhor poderá recomeçar sua vida depois de algumas seções de fisioterapia e reabilitação, só precisará de muita perseverança e persis...
-NÃO!

Novamente, a dor de cabeça tomou conta e a dose de morfina que me era aplicado não era o suficiente, a ponto de me fazer desmaiar e cair em um sono profundo...

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